A Ideologia Alemã, de Karl Marx e Friedrich Engels - Resenha simplificada em série (Parte 4)




A partir do surgimento de um partido comunista real na Alemanha, é evidente que os socialistas verdadeiros se restringirão cada vez mais a um público de pequeno-burgueses e a assumir o papel de literatos impotentes e decaídos como representantes deste público. (MARX, Engels, 2008, p. 439).

Os filósofos apenas interpretaram o mundo de diferentes maneiras; porém, o que importa é transforma-lo. (Marx, tese 11 sobre Feuerbach, 2008, p. 539).

A última parte da Ideologia alemã é aquela na qual mais se aplica a tese 11 a Feuerbach, o segundo volume da violenta e sarcástica crítica de Marx e Engels é direcionada aos militantes socialistas franceses e alemães, exemplos práticos daqueles sobre os quais vieram escrevendo no primeiro volume, voltado aos teóricos abstracionistas jovens hegelianos.
Os autores são defensores da práxis, uma atitude crítica da ação e uma ação a partir da crítica, a partir da análise social prática e suas contradições estruturais a ação seria planejada e executada e, posteriormente a ação, novos conceitos seriam criados, ou seja, não há prática sem teoria, nem teoria sem prática.
A práxis tem, na teoria marxista, papel central, ela tanto pensa a atitude, a torna mais útil, frutuosa e pragmática, quanto promove uma renovação teoria constante diante de um objeto, o capitalismo, que está em persistente transformação. O objeto de estudo do marxismo é seu próprio inimigo, o sistema capitalista e suas estruturas, assim, Marx e Engels são pais de uma criação destruidora.
E é ai que começa a crítica polêmica aos socialistas utópicos (Chamado ironicamente por eles de “socialismo verdadeiro”) e seus “diferentes profetas”: práxis é um elemento que lhes passa despercebido, pois estes ou são idealistas que sacralizam o mundo, sentimentalistas ou reformadores do sentimento cristão, pregando um novo reino de Cristo na Terra, que seria construído pelos oprimidos. Para Marx e Engels tais movimentos estavam construídos sobre alicerces de areia, ou, melhor, seus alicerces estavam apenas no mundo das ideias. (Marx chama Georg Kuhlmann, socialista alemão, de “padreco” na página 514).
Marx e Engels atacam violentamente esses profetas do socialismo que, na verdade, não tem nada a oferecer senão fraseologias e baboseiras sentimentalistas como amor, fraternidade universal e Reino de Cristo, sem sequer indicar caminhos práticos para levar a tais fins, seduzindo as massas pela euforia, mas não oferecem ao povo quaisquer projetos reais além de uma crítica romântica do capitalismo.

Por não saber das condições reais de produção e consumo, não lhe resta outro refúgio a não ser o derradeiro esconderijo de um socialista verdadeiro, a essência do homem. (Marx, 2008, p. 399).

A crítica dos autores a militância sem pragmatismo e sem formação teórica até hoje é polêmica e atual (Vivemos em ressurreição do movimento hippie, críticos românticos do capitalismo, que tem como pautas principais a “paz” e o “amor universal”, além de uma volta a “mãe natureza”) e serve também de autocrítica aos próprios marxistas: Estamos tomando Karl Marx religiosamente? Usando frases feitas deste como respostas fechadas? Se sim, tal atitude é completamente anti-marxista.
Estudar a Ideologia alemã nos mostra que ser um marxista não está em saber Marx de cor, mas em conhecer os conceitos juntamente a práxis, essa atitude materialista pode levar, inclusive, um marxista do Século XXI a discordar do próprio Marx, o que não é contraditório, é parte da estrutura do próprio marxismo, Edward P. Thompson e Perry Anderson foram marxistas que discordaram de Karl Marx em conceitos chave, como cultura e modo de produção asiático, tais autores foram verdadeiramente marxistas, pois ser marxista é estudar a realidade cirurgicamente, relacionamento a teoria a prática sociocultural, a atividade humana em sua reprodução, encontrando nela suas contradições estruturais e refletindo sobre elas, mas não apenas, deve-se agir a partir dai.
Renovar o marxismo é obrigação de todo marxista, utilizar textos de Karl Marx, Engels ou Lenin como relíquia religiosa é ser aquilo que o próprio Marx mais desprezava e criticava violentamente, um profeta do socialismo. O capitalismo, objeto de estudo e, consequentemente, de enfrentamento do marxismo, está em transformação constante, se a práxis não for colocada, uma que acompanhe as transformações capitalistas, estaremos fadados a criticar e a atacar sombras.

Bibliografia consultada:

HOBSBAWM, Eric. O que os Historiadores devem a Karl Marx? In: HOBSBAWM, Eric. Sobre História. 2ª ed. Tradução de Cid Kinipel Moreira, Companhia das Letras, São Paulo, 2010.

MARX, Karl; ENGELS, Friedrich. A Ideologia Alemã: Crítica da mais recente filosofia alemã em seus representantes Fuerbach, Bruno Bauer e Max Stirner, e do socialismo alemão em seus diferentes profetas (1845-1846). 1ª ed., Tradução de Rubens Enderle. Boitempo Editorial, São Paulo, 2007.

Série - A IDEOLOGIA ALEMÃ: Resenhas simplificadas

SUED

Nome artístico de Línik Sued Carvalho da Mota, é romancista, novelista, cronista e contista, tendo dois livros publicados, também é graduanda em História pela Universidade Regional do Cariri. Militante comunista, acredita no radicalismo das lutas e no estudo profundo de política, sociologia, História e economia como essenciais para uma militância útil.
Escreve ao Ad Substantiam semanalmente às segundas-feiras.
Contato: lscarvalho160@gmail.com





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