PRAÇA POENTE – LÚCIO, LUÍS, JOÃO E O LAR
Potira itapitanga.
Quinta-feira João foi à pracinha do bairro com o
poente. A noite se foi. Sexta chegou; passou. Sábado. Domingo. Segunda-feira
João chegou da pracinha com a aurora.
- Onde você estava, moleque? – Pergunta Lúcio.
- Por aí.
- Senta. Vamos tomar café. – Contemporiza Luís.
Entre um pão e outro
- João! Onde você esteve?
- Estão bravos comigo.
- Estou! – Lúcio confirma e continua: Estávamos mais
preocupados. Mas o que aconteceu que você sumiu?
Então ele contou. Encontrou uma antiga galera que o
convidou para uma noite irada que se estendeu por todo o fim de semana porque
conheceu Júlia e ela iria para o sítio de seu pai que aceitou a presença do
garoto porque ambos garantiram que eram colegas de escola e que tinham a
autorização do pai dele, que era militar. Lúcio ficou uma fera com o pai da
garota, que não buscou informação com adultos. Luís é que o impediu de ligar
para o sujeito naquela hora. “É melhor acalmar primeiro”.
- João! – Disse Lúcio. – Quero que compreenda umas
coisas. Você é bem vindo aqui. Entende isso?
- Ah! Sim!
- Entende também que gostamos de você e que te
queremos bem?
- Sim. Por quê?
- Porque Luiz e eu queremos adotar você...
- Sério?
Resiste um pouco, mas Lúcio não segura o sorriso.
- Sério! Mas queremos saber se você quer morar
conosco. Você quer?
- É o que mais quero.
- Então terá que entender que aqui é uma família. Uma
comunidade onde existem regras para serem seguidas. Não burladas.
- Sabe o que burlada? – Interrompe Luís,
participando.
- Sei! É desobedecida.
- Somos uma família – continua Lúcio – e isso
significa que um cuida do outro. Que ninguém abandona ninguém. Que damos
satisfação do que fazemos. E tudo isso porque todos se respeitam, se gostam, se
amam.
- Sabe o que Lúcio está querendo dizer?
João fica em silêncio olhando para a caneca de café
com leite.
- O que estou querendo dizer que nós amamos você. E
que estamos te dando uma oportunidade de fazer parte de nossa família. Está
acompanhando o raciocínio?
- Acho que sim.
- Em resumo – Luís toma a palavra – queremos que você
more legalmente conosco e que estamos te dando uma escolha.
- A escolha – Lúcio conclui – é entre continuar na
rua com os atrativos irados das velhas galeras. Ou ter uma família; ser parte
da nossa família, com suas normas.
- Aqui não é hotel para vir só para dormir. – Fala Luís.
– É um lar com direitos e deveres.
- Não estou gostando do papo. Quero sair...
- Mas vai ficar até encerrarmos o assunto. – Lúcio o Interrompe.
– Estamos te dando uma escolha. Aqui não é pensão para você entrar e sair ou
sumir sem dar satisfações. Você escolhe: Vai para onde quiser ir. O que nos
deixará muito infeliz. Mas você é livre para ir e vir então respeitaremos sua
decisão de ir e morar com a galera. Ou você fica, o que nos deixará
completamente feliz. Mas seguindo as normas e usufruindo dos direitos e deveres
de um membro da NOSSA família.
- Você decide. – Luís encerra e se levanta.
- Pense o dia todo e nos dê a resposta quando chegarmos
do serviço hoje à noite. – Lúcio também se levanta, estica sua bengala branca,
mas segura no braço do companheiro e os dois vão para o quarto vestirem seus uniformes
de trabalho.
Na sala de espera do Fórum de Ipatinga
- Filho! – Fala o pai do Lúcio. – Se a
situação não for favorável não se preocupe porque sua mãe e eu estamos
dispostos a adotar o João.
- Faço minhas as palavras de seu pai, Lúcio. –
Diz Cloenes, mãe do Luís. – Se eles não puderem, João vai morar comigo e com
Lucas.
- Papai, mamãe e Cloenes, mas aí João teria
que morar com vocês, não conosco. Agradecemos, mas não é o que queremos.
- Sabemos que a intenção dos senhores –
continua Luís – é boa e movida pelo afeto. Se não pudermos ficar com ele então
que os senhores ou que mamãe o adotem. Mas acreditamos que tudo vai dar certo.
- O Juiz há de...
Lúcio é interrompido pela funcionária da
justiça, que os chama para a audiência.
Para saber mais sobre nossos amigos, leia:
Rubem Leite
Escritor, poeta e crontista; professor de Português, Literatura e Artes.
Escreve ao Ad Substantiam semanalmente às quintas-feiras.
Cronto pensado e criado em 2009 e retrabalhado entre os dias 10 e
18 de agosto de 2016.
Não acreditei quando a história não continuou. Sabe aquela porção de sobremesa que a gente come e sente pena quando está acabando? É isso. Essa história tem gosto bom que dá pena parar de ler e dá vontade de começar de novo. me fez lembrar de uma propaganda de iogurte que tem uma musiquinha assim: "Quando acaba a gente quer de novo! Gostoso... Saboroso... Quando acaba a gente quer de novo..."
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