Ante a mais solitária solidão
A fogueira está a
queimar, o homem está a cutuca-la com um espeto, o brilho das faíscas e
labaredas refletem em seus olhos, sua sombra aparece crescida na rocha que o
abriga. Seu bando? Sabe-se lá onde está, olhe lá se possui um bando. Nas noites
frias aquece-se com uma fogueira feita por si mesmo e cobre-se com a pele dos
prêmios de suas caçadas.
Seus olhos, porém,
mostram uma melancolia sem tamanho, são pesados e cheios de tristeza, talvez o
abraço das peles dos animais mortos não sejam suficientes, talvez precise de um
abraço vivo e quente.
Ante a mais solitária solidão o homem estende seus
olhos para o alto e vê os pontos brilhantes, o céu escuro está cheio deles,
senta-se ao lado de sua fogueira a ser abraçado pela pele sem vida e observa,
indiferente, os pontos. Um dos pontinhos chama-lhe a atenção, brilha mais do
que os outros que pôde observar, este em específico o deixa maravilhado,
boquiaberto.
O hominídeo estende o braço na direção do brilho,
articula sons, não consegue alcançar o maravilhoso ponto luminoso. Levanta,
eleva mais uma vez seu braço ao céu... Em vão. Enfurecido, o homem grunhe
sonoramente, joga-se no chão e bate em si mesmo, odeia a si por não ser capaz
de nem sequer poder tocar tão venerável beleza.
Volta-se então para os montes, percebe a elevação
transcendental que vai da terra ao alto, vislumbra ai sua oportunidade. Sem
considerar qualquer possível revés, o homem ascende uma tocha e põe-se a
caminhar para a formação rochosa, seus pés descalços tem duras solas, está
adaptado a este ambiente hostil. Ele não caminha, dá pequenos pulos rumo ao seu
destino enquanto segura a tocha.
As horas passam, os pés do homem estão intactos,
como previsto, a tocha fez seu papel em afastar os traiçoeiros lobos que
espreitam em alcateia na floresta. Apesar de seus pés estarem bem, o homem está
ofegante, porém tenta com louvável esforço manter seu ritmo acelerado rumo ao
topo, precisa alcançar aquela grande beleza, antes que o sol surja fazendo-a
desaparecer, sabe-se lá se voltará a vê-la, afinal. O suor escorre, seu pelo
está todo úmido.
Mais algumas horas se passam, a epopeia parece ter
terminado, o homem chegou ao topo da estrutura rochosa, respirando cansado olha
para o céu mais uma vez e vê seu desejado e magnífico ponto luminoso. O
hominídeo enche-se de esperança, usa suas forças restantes para estender o
braço, inutilmente. Desespera-se, sua respiração acelera, estica o braço o
máximo que pode, pula o mais alto que consegue. Sem resultado.
Olha para baixo, uma lágrima escorre por seu triste
rosto. A expressão muda repentinamente, ele parece agora enfurecido, sua face
se contrai e rugas surgem na face peluda. Limpa as lágrimas e passa a grunhir
furiosamente para o alto, os lobos assustam-se com tamanha fúria.
Não grita para o ponto luminoso que tanto almeja,
grita contra si mesmo ante a mais solitária solidão.
SUED
Nome artístico de Línik Sued Carvalho da Mota, é romancista e contista, tendo dois livros publicados, também é graduanda em História pela Universidade Regional do Cariri. Militante comunista, acredita no radicalismo das lutas e no estudo profundo de política, sociologia, História e economia como essenciais para uma militância útil.
Escreve ao Ad Substantiam semanalmente às segundas-feiras.
Contato: lscarvalho160@gmail.com
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